Sabes, é que eu estou farta - muito farta. Não farta no sentido suicida da coisa, porque até disso estou farta. O glamour sórdido dos suicidas, eternamente grata a eles por demonstrarem que há uma opção, tem tanto de invejável como de patético. Estou farta do que não faz sentido, mas farta de sentir-me fascinada pelo que não tem sentido.
Se estou farta do que não faz sentido, então imagina o que me satura a lógica. A obrigação de manter um espírito científico (trago bisturis e lupas na carteira), é cansativa. Farta-me tentar saber mais, sabendo, no entanto, que me irrita a ignorância. Gostava que a lógica se pudesse calcular através de um equação bem definida. Uma equação regressiva, quem sabe. Ou uma pôrra de um gráfico. Bem, um gráfico, seria genial – uma curva sinosoidal e, pimba!, isto afinal está completa, irrevogavel e definitivamente desprovido de lógica. Eu sei, está aqui no gráfico que acabei de fazer na mão, caneta de feltro preta.
É, estou farta de ser atormentada pelo(s) sentido(s). Existencial, claro está. Estou farta do Camus, do Sarte e da sua compincha Simone (já reparaste como, ironicamente, o nome da mulher é tão pomposo? DE BEAUVOIR...), que chatice, sempre a fazerem-me puxar pelos neurónios, cansados como certamente sabes. Será que esta companhia de prezados intelectuais morreu mais feliz do que a maioria? Até do Nietzche eu estou farta. Tanto niilismo desespera-me, ao mesmo tempo que me faz procurar, incessantemente, o Super Homem. Estou farta de comprar excessivas doses ‘de nada’, em livrinhos de bolso de duzentas e tal páginas.
Estou farta de dizer a mim própria: serei mais feliz no dia em que conseguir conciliar Marx e Sarte. Bem visto! Na realidade, consoante os dias, compraria um pouco disto e um pouco daquilo: ‘P.f., queria 200 gr de angústia de Steinbeck e 250 gr da esquizofrenia de Pessoa....em papel de alumínio, sim...500 gr de alucinações do Kafka e, já agora, para os dias cinzentos, um pouco da leveza do Kundera’. Mas sabes, estou efectivamente farta de procurar neles as respostas.
Estou farta da imposição das necessidades básicas. Vamos ver se nos entendemos de uma vez por todas: comer é um acto nojento. Quase pornográfico, ingerir alimentos só para ser a testemunha silenciosa de um processo de putrefacção que dura sensivelmente 24 horas por dia.
Estou farta de TV, mas acordo com as notícias todos os dias. Óbvio, pufffff!!!!, estou farta de desgraças e por isso mudo de canal constantemente. Já não aguento o concurso ‘quem é o mais desgraçado de Portugal’. E depois de dizer isto fico com peso na consciência.
Estou farta de afogar as mágoas na minha selecção de cd’s. Filantropia, será? Estou farta da minha obsessão pela música, ouvi-la até saber de cor cada frase, cada métrica, cada microsegundo, só para ouvir aquela nota de fundo que o produtor deixou, intencionalmente, fechada a 7 chaves. Estou farta de mergulhar naquelas músicas que ninguém ouve, bebo-as como se fossem shots e fumo-as como se fossem coca. Já que o meu passado, como tu tão bem sabes, não me permite chegar mais perto do que isso. Hoje em dia tudo é mainstream. Já para não esquecer que tudo são vícios e dependências.
Para mais, estou farta do meu ginecologista: nada mais humilhante do que abrir assim as pernas para um tipo que eu não conheço de lado algum, sem bebida e sem preliminares (hmm, deve ser assim que as pessoas se sentem quando vão ao psicólogo).
E tudo isto para te tentar explicar, minha querida e velha amiga, o porquê de me achares tão...blasé. Era isto que querias?
by fiona bacana
Saturday, April 09, 2005
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