Tuesday, May 03, 2005

Pai e filho

Continuo a achar que é para te poupar de alguma coisa que ainda não conseguiste perceber. Ou então não. Estás só perante a altura, inevitável para todos e que só se diferencia no tempo de chegada, de perceberes que até ele é falível. Os únicos santos que conheço têm todos pés de barro....

by fiona bacana

« - Oi pai. Sou eu. Eduardo.
Um silêncio já esperado teve lugar.
- O que acontceu? Que horas são?
- Não sei. Não aconteceu nada. Só resolvi te dizer que eu vou escrever sobre você.
- Sobre mim?
- É.
- Onde?
- Num livro.
- No tal livro da Mariana?
- É?
- Eu já sabia. O prefácio, não é?
- Hum-rum. Mas eu quero te avisar que vou escrever mesmo, falando a verdade.
- A verdade?
- É.
- Você quer dizer que vai falar de mim, é isso?
- Não. Quero dizer que quero contar a verdade. Contar, por exemplo, como você foi generoso, ao me encaminhar na literatura, chamando-me de ‘mais um palhaço na família’.
- Hum. Eu queria te poupar.
- Hum. Poupar de quê, posso saber?
- Da dor.
- Ah, da dor.
- É, da dor.
- E alguma coisa dói no homem de gelo?
- Homem de gelo?
- Sim. Achou cafona?
- Achei, mas tudo bem.
- Hum.
- Dói. Dói muita coisa.
- Por exemplo?
- Você quer um exemplo?
- Quero. De algo que tenha doido em você. »

Fernanda Young, «Aritmética»

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